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Há 50 anos, os presos do Tarrafal, foram libertados.

Neste campo, os presos viam morrer os companheiros - 36 dos cerca de 600 que lá passaram, morreram. 32 eram de nacionalidade portuguesa, 2 eram guineense e 2 eram angolanos. A maioria foi torturada, não havia cuidados médicos e ficavam isolados do mundo. O único médico que por lá passou, nãos lhes prestava cuidados - "estava lá só para passar certidões de óbito".

O campo, localizado "na aldeia de Chão Bom, no Concelho de Tarrafal, na ilha de Santiago" em Cabo Verde, abriu em 1936, "durante um processo de reorganização do sistema prisional do Estado Novo, com o objetivo de encarcerar presos políticos e sociais," sobretudo aqueles que se opunham ao regime fascista. 

Esta "localização foi escolhida de forma estratégica, tanto por ser perfeita para que os testemunhos não viessem a público, com principal objetivo de aniquilar física e psicologicamente os opositores portugueses e africanos à ditadura Salazarista, isolando-os do resto mundo em condições desumanas de cativeiro, maus tratos e insalubridade." Muitos eram deixados a morrer de forma "natural", ou seja, completamente deixados ao abandono sem qualquer tratamento, por exemplo, contra a tuberculose que ali se instalava facilmente.

Em 1956 fecha portas, mas volta a reabrir em 1962, com o nome de "Campo de Trabalho de Chão Bom." Nesta fase, o campo destinava-se "a encarcerar anticolonialistas de Angola, Guiné-Bissau e Cabo Verde, altura em que morreram dois angolanos e dois guineenses." A 1 de maio de 1974, o campo foi encerrado e posteriormente passou a museu. Doenças, subnutrição, torturas, igual "àqueles de Hitler na Alemanha". 

Hoje, além de se celebrar a passagem do 50 anos, sobre o encerramento deste terrível campo de concentração, assinala-se também a passagem de mais um Dia do Trabalhador. O 1º de Maio é celebrado em vários países e, tem por base, a greve que decorreu neste mesmo dia, mas em 1886, em Chicago. Os trabalhadores gravistas, pretendiam exigir melhores condições de trabalho, sobretudo "a redução da jornada de trabalho diária," das habituais dezassete horas, para oito horas diárias.

Poderia aqui descrever muitos episódios e factos históricos que fui descobrindo nas minhas pesquisas (sabem que eu adoro História...) mas tornaria este post muito extenso. Deixo aqui apenas um pequeno excerto:

"Em 1833, oficialmente, o horário de trabalho das crianças foi reduzido para as 48 horas semanais." "Em 1844, pela primeira vez, é estabelecida a semana de trabalho de 69 horas, com um limite máximo de 12 horas diárias."

 Após anos de luta, em 1886, dá-se o "Massacre de Chicago":

"80000 trabalhadores a abandonarem o trabalho e a irem para a manifestação. Com o governo a mobilizar mais de 1000 polícias para vigiar e intimidar os trabalhadores. (...)Os trabalhadores despedidos não desistem e no dia 2 de maio algumas centenas realizam um comício em frente à fábrica que os tinha despedido. É chamada novamente a polícia que investe sobre os trabalhadores e começa a bater para os dispersar, provocando várias mortes e causando dezenas de feridos."

"Os trabalhadores voltam à carga e é realizado um segundo comício para protestar contra a brutalidade policial, (...)Quando restavam cerca de 200 trabalhadores, eis que explodiu no meio dos polícias uma bomba matando um deles e ferindo muitos outros. Foi o caos, com os polícias a dispararem sobre a multidão em fuga, ficando as ruas cobertas de sangue, mortos e feridos."

"Nos dias que se seguiram, centenas de dirigentes e trabalhadores foram presos. Houve um mega-julgamento no mesmo ano de 1886, tendo sido condenados à morte por enforcamento sete sindicalistas. Alguns foram condenados a prisão perpétua e outros quatro dirigentes sindicais foram executados a 11 de novembro de 1887, pelas 11.30."

Pouco tempo depois o governo assume perante a opinião púbica que estes sindicalistas estariam inocentes.

No ano de 1889, o "Congresso Operário Internacional, reunido em Paris," decreta então esta data como o "Dia Internacional dos Trabalhadores."

Em Portugal, esta data é celebrada desde 1890, numa época em que a monarquia dava as suas últimas cartadas. "Nas comemorações do 1.º de maio em Portugal, em 1890, a manifestação em Lisboa reclamou do município «o estabelecimento das 8 horas diárias e a regulamentação do trabalho de menores». No Porto, a comemoração aconteceu no Monte Aventino, atraindo milhares de trabalhadores."

O Estado Novo veio acabar com esta comemoração. "Só a partir de maio de 1974," depois da Revolução, "é que se voltou a comemorar livremente o Primeiro de Maio, que passou a ser feriado. Nesta data," estima-se que tenham estado 500 mil pessoas na manifestação do Dia do Trabalhador de 1974," só na capital.

5o anos depois, o povo continua a celebrar esta data!

 1º de Maio em Portugal

Em Moçambique, também "durante o período colonial," estavam proibidas quaisquer celebrações do "Dia do Trabalhador, em virtude da natureza repressiva do regime colonial português. No entanto, houve manifestações de trabalhadores moçambicanos, em particular em Lourenço Marques (atual Maputo), contra o modo de relações laborais existente naquele período."

Fontes:

https://observador.pt/2024/05/01/portugal-cabo-verde-guine-bissau-e-angola-assinalam-libertacao-do-tarrafal/

https://rdpafrica.rtp.pt/noticias-africa/50-anos-sobre-a-libertacao-dos-presos-politicos-do-campo-do-tarrafal/

https://www.jornaldeangola.ao/ao/noticias/angola-nos-50-anos-da-libertacao-dos-presos-do-tarrafal/

https://pt.wikipedia.org/wiki/Dia_do_Trabalhador

https://observador.pt/opiniao/historia-concisa-do-1-o-de-maio-dia-do-trabalhador/

 

 

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publicado às 19:51

Nos últimos dias tenho lido muitos relatos de antigos combatentes, sejam feitos pelos próprios, sejam pelos seus familiares, e muitas vezes tenho dado por mim a chorar com vários destes testemunhos e a pensar "Como é que foi possível?" e depois penso... muitos nunca foram devidamente ressarcidos daquilo que sofreram, daquilo que perderam...

A Guerra Colonial começou em 1961, onde a União dos Povos Africanos (UPA), subsidiada pelo então governo dos Estados Unidos torna Angola no "palco da primeira resistência armada ao colonialismo português." Em 1963, a ação estende-se à Guiné-Bissau e no ano seguinte, a Moçambique.

A NATO, a que Portugal tinha aderido, era também contra a existência de Colónias (e a solução encontrada por Salazar foi mudar-lhes a denominação para Províncias Ultramarinas). "Simultaneamente os Estados Unidos continuavam a pressionar na frente diplomática ao ponto de no dia 15 de março de 1961 nas Nações Unidas, ao lado da URSS, condenarem a repressão que se seguiu ao ataque às prisões de Luanda na madrugada de 4 de fevereiro por parte de nacionalistas angolanos." Salazar, que teria sido avisado "pela CIA de um ataque da UPA no norte de Angola  a coincidir com o debate sobre Angola nas Nações Unidas," não confiou na veracidade da informação. O gatilho desta guerra, que duraria 13 longos anos "começou norte de Angola, distrito de Malange, na Baixa do Cassange, motivado pelas condições de trabalho a que os agricultores estavam sujeitos," que os fazia viver na "miséria," e pela revolta que sentiam contra os maus tratos a que eram sujeitos pelos "funcionários da Cotonang." Este não foi episódio único e já a PIDE estava no local a realizar interrogatórios. "Os acontecimentos na Baixa do Cassange prolongam-se até março mas logo a 6 de fevereiro um loockeed PV-2 Harpoon bombardeia a região com napalm. O número de mortos não é certo, variando entre as dezenas e os milhares." (Na exposição que está no quartel do Carmo, podemos ver as máscaras de proteção utilizadas).

Mas o MPLA atribui o início das hostilidades ao momento do ataque às prisões de Luanda ocorridas a 4 de fevereiro desse ano, depois do navio Santa Maria (desviado pelo capitão Henrique Galvão), ter atracado em Luanda.

"No dia 15 de março, tal como a CIA tinha dito e tinha feito chegar a informação a Salazar, a UPA ataca dezenas de fazendas de café no norte de Angola são atacadas em simultâneo. Os ataques provocam 800 mortos portugueses e africanos," o que terá "sido determinante para o governo português perceber que a revolta estava em curso." Estes acontecimentos no norte de Angola, "lançaram o pânico entre os colonos portugueses. No espaço de uma semana, mais de 3 mil colonos foram evacuados desta região para Luanda." A situação complicava-se cada vez mais, com a demora da chegada dos reforços vindos da capital (chamada "metrópole") e com a formação de guerrilhas. "No dia 7 de maio, o governo do distrito de Carmona, ameaçado pelo assassinato de centenas de trabalhadores indígenas das suas fazendas, pedia ao governo-geral que enviasse urgentemente reforços militares." Várias operações vão tendo lugar, entre elas, a Operação Viriado, ou a Esmeralda, mas de ambos os lados os mortos e feridos são demasiados! 

Na Guiné, a situação já precária e sob a influência do que se passava noutras "províncias", leva a que a revolta começa em 1963, com guerrilhas do PAIGC a penetrar no território. "A fim de destruírem as bases de apoio às forças rebeldes, aviões portugueses largaram bombas e napalm sobre várias aldeias guineenses, situação que viria a ser denunciada pela Conferência das Organizações Nacionalistas das Colónias Portuguesas desse ano." A 25 de setembro de 1964, "tinham lugar os primeiros ataques da FRELIMO, em Cobué, no distrito do Niassa." Estava instalada a guerra em três frentes.

Em maio de 1968, o regime por temer a perda de controlo da situaçã na Guiné, "substitui os comandantes na altura, pelo Brigadeiro António Spínola" que era "filho de uma família abastada," tendo o seu pai sido "inspetor-geral de Finanças e chefe de gabinete de Salazar no Ministério das Finanças." António Ribeiro de Spínola é nomeado "governador e comandante-chefe da província." Spínola tinha estado em Angola entre 1961 e 1963 e conhecia já bem a especificidade dos movimentos de guerrilha. Mas, apesar do aparente sucesso da operação secreta, Mar verde, o "agravamento da situação na Guiné-Bissau" levou a que Spínola começasse "a duvidar cada vez mais da solução militar para este território. Em maio de 1972, o general encontrou-se no Senegal com o presidente Leopold Senghor a fim de preparar negociações de cessar-fogo com o PAIGC e de encontrar uma solução política para a guerra. Esta solução seria, no entanto, rejeitada por Marcello Caetano." Em janeiro de 1973, Amílcar Cabral foi "assassinado, em Kaloum," e segundo algumas versões, "a PIDE ou o próprio Spínola teriam estado envolvidos na organização e aprovação do atentado," o que foi negado pelo "o governo português." Em março desse ano, o PAIGC começou "também a utilizar misseis soviéticos terra-ar, acabando assim com a supremacia aérea portuguesa, essencial à contra-guerrilha."

Em Novembro de 1973, Spínola "é convidado por Marcello Caetano," que tinha substituído Salazar, "para ocupar a pasta de ministro do Ultramar, cargo que não aceita." 

A 17 de Janeiro de 1974, Spínola é ainda "nomeado para vice-chefe do Estado-Maior das Forças Armadas, por sugestão de Costa Gomes, cargo de que é demitido em Março, por se ter recusado a participar na manifestação de apoio ao Governo e à sua política." Acabaria, numa reviravolta que se pode dizer histórica e inusitada, por ser ela a aceitar, no Quartel do Carmo, a rendição do Governo, ou seja, a aceitar o poder em nome do Movimento das Forças Armadas, embora depois disso, nem sempre tenha estado do lado dos mesmos.

Destes conflitos, ou - se quisermos juntar "tudo" - da Guerra Colonial, chegaram muitos estropiados, outros tantos mortos! O que eu acho que se tem de trazer, ainda, para as mesas de debate, são a falta de cuidados que foram prestados às vítimas reais e com nome deste conflito! Depois da Revolução, não foram respeitados os direitos destes homens que, saindo do país (muitos deles obrigados), deixaram cá mulher, namorada, filhos, pais, avós... uma casa e um trabalho a que muitos não conseguiram regressar. Regressaram eles homens diferentes! Com outros medos e terrores e, também, alguns deles, com outros valores!

Um dos testemunhos que estive há pouco a ler foi o de uma filha. A filha de um homem que ela carateriza como trabalhador e lutador, apesar de ter sofrido graves ferimentos que o tornaram num dos muitos estropiados de guerra. Ela descreve que, na convivência com o seu pai, se foi apercebendo das graves consequências de uma guerra maldita - que muito além de físicas - são também psicológicas. Se lerem a totalidade deste relato talvez sintam, como eu, um murro no estômago. Desse relato são os seguintes excertos:

Creio que nunca fez as pazes consigo próprio por isso. Ou, pelo menos, nunca conseguiu apaziguar-se. Por ter marchado para o matadouro. Por se ter tornado carne para canhão. Por ter matado, visto morrer. Pelos horrores que fez, os horrores que viu fazer. “Tu não imaginas o que eu fiz”, dizia-me.

Quando tomavam consciência de que a nossa História, a história do colonialismo português, que não teve nada de brando, a história da Guerra Colonial, eram permanentemente branqueadas, e que eles próprios se tornavam num estorvo difícil de gerir. E a sua perplexidade quando, ainda hoje, a Guerra Colonial é nomeada de guerra do ultramar, quando as ex-colónias são chamadas de províncias ultramarinas.

Muitos dos que vinham feridos com gravidade, eram "descarregados" durante a noite para que o país não os visse e tivesse noção da realidade. Diz-se que "noventa por cento da população jovem masculina do país foi mobilizada para a Guerra do Ultramar." E diz-se também que esta Guerra "causou cerca de 10 mil mortos e 20 mil inválidos entre os soldados e mais de 100 mil vítimas entre os civis que viviam nas colónias."

Vejam este pequeno filme da RTP Ensina e oiçam também esta canção de Paco Bandeira, que retrata as dificuldades dos tempos da Guerra Colonial. 

Num outro testemunho, publicado no CM, um ex-combatente (da Cavalaria 2, Moçambique) explica como foi a sua passagem pela Guerra Colonial.

Passados seis meses em Lourenço Marques calhou-me a parte difícil. Estive 18 meses em Mueda, o coração da guerra. Havia picadas, minas, escoltas a viaturas para abastecer, capturas é que não fazíamos. As picadas eram as estradas sem alcatrão, com muitas minas anti-carros e anti-pessoais. Feridos e mortos eram muitos, e botas ainda com o pé, separadas do corpo, era o que se via mais. Ainda me custa falar disso; as cenas voltam à memória quando se fala delas.

Nas colunas, havia um grupo que ia à frente com arame grosso, e esses é que sofriam. Quando detectavam alguma coisa eu tinha o papel ingrato de decidir o que fazer. Éramos obrigados a levantar minas, pois o Salazar queria exibir isso como troféu junto das Nações Unidas, mas nós fazíamos o rebentamento, pois era menos arriscado. Ainda assim, houve muitos feridos e estávamos dependentes da sorte. 

E os traumas... os traumas não eram só físicos. Leiam o depoimento desta mulher, de nome Diana, que fala da situação que viveu ao longo da sua infância e juventude com o pai (ex-combatente). Fica aqui apenas um pequeno excerto, o resto é o retrato de tantas outras casas e famílias portuguesas.

"Não me lembro de o meu pai me dar carinho, sou a mais velha de sete filhos e não me lembro de andar ao colo. Quando ele chegava do trabalho, a minha mãe fazia questão de eu já estar a dormir porque pela mais pequena coisa havia logo um estalo... Às vezes olhava para outras crianças na escola e fazia comparações, via os pais a passar a mão pela cabeça dos filhos e pensava que gostava que o meu pai me fizesse o mesmo."

No mesmo artigo, existem outros testemunhos, bastante dolorosos. O de Sandra é um pouco diferente, mas retrata também um pai sempre em alerta.

"A minha mãe contava que, quando se casaram, o meu pai se escondia debaixo da cama por causa dos foguetes, não podia ouvir barulhos, era um pouco agressivo com os animais. Mas nunca foi agressivo para a minha mãe, nem para nós."

Em ambos os casos, a ajuda extende-se aos filhos e às mulheres destes ex-combatentes, que sofrem de stress pós-traumático secundário, por conviverem ao longo de vários anos com as ações e reações dos seus familiares. Infelizmente, a ajuda é pouca. "Existe uma Rede Nacional de Apoio (RNA) para acompanhar os militares com perturbação psicológica crónica resultante da exposição a fatores traumáticos de stress durante a vida militar."

A RNA, tem como principais objetivos: "informar, identificar e encaminhar os casos de PTSD adquiridos em contexto de guerra, e prestar serviços de apoio médico, psicológico e social aos utentes da RNA, em articulação com o Serviço Nacional de Saúde (SNS)."

Segundo dados de 2019, do "Ministério da Defesa, há 2073 utentes da rede inscritos nas cinco associações protocoladas: Associação dos Deficientes das Forças Armadas (ADFA), Associação Portuguesa dos Veteranos de Guerra (APVG), Associação de Apoio aos Ex-Combatentes Vítimas do Stress de Guerra (APOIAR), Associação de Combatentes do Ultramar Português (ACUP) e Associação Nacional dos Combatentes do Ultramar (ANCU). Das pessoas que recebem apoio desta rede, 139 são mulheres e 85 são filhos."

Fontes:

https://www.esquerda.net/dossier/estilhacos-de-uma-guerra-maldita/63480

https://media.rtp.pt/descolonizacaoportuguesa/pecas/a-guerra-instala-se-em-tres-frentes/

https://www.rtp.pt/programa/tv/p32446/e26

https://www.presidencia.pt/presidente-da-republica/a-presidencia/antigos-presidentes/antonio-de-spinola/

https://www.dn.pt/edicao-do-dia/09-mar-2019/interior/guerra-colonial-os-traumas-herdados-pelos-filhos-dos-ex-combatentes-10480419.html/

https://www.cmjornal.pt/domingo/detalhe/nao-houve-dia-sem-mortos-e-estropiados

 

 

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publicado às 16:29

Amílcar Cabral - 50 anos da sua morte

por Elsa Filipe, em 20.01.23

A 20 de janeiro de 1973, alguém assassinou Amílcar Cabral, à porta de sua casa, em Conacri, na República da Guiné.

Amílcar Cabral, nasceu a 12 de setembro de 1924, em Bafatá, na Guiné, tendo partido com a família "para Cabo Verde com oito anos." Formou-se em agronomia, mas foi como "líder independentista" e fundador do PAIGC, que se destacou. Desde 1960, Amílcar Cabral conduzia "a partir de Conacri, a luta contra o regime colonial português." Queria libertar a Guiné do "imperialismo" português. Naquela noite, ao regressar para casa (local onde morava com a "mulher e a filha" e onde também conduzia "a luta contra a ocupação portuguesa da Guiné-Bissau e Cabo Verde"), vindo de uma receção na embaixada da Polónia, foi atingido com três tiros que se revelaram mortais.

Há quem afirme que os responsáveis pela sua morte terão sido membros do seu próprio partido (PAIGC) e, para isso terá certamente contribuído a ideia de que dentro do PAIGC havia claramente fações com ideias divergentes das suas. Segundo Rossi Cancola, diplomata guineense, "Amílcar Cabral morreu baleado pelas autoridades portuguesas," ou seja, pela PIDE, "contrariando a versão final de vários historiadores que apontam opositores internos como os responsáveis pela morte do dirigente do Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde." Como militar, terá criado sérias "dificuldades a Portugal durante a guerra colonial."

A sua morte não deitou, porém, abaixo a causa e, a luta até se intensificou. "Aristides Pereira, substituiu-o na liderança do PAIGC." 

A Guiné-Bissau proclamou unilateralmente a sua independência a 24 de Setembro de 1973. A estátua erguida em sua memória, em frente à sua casa e onde hoje se situa a "embaixada da Guiné-Bissau em Conacri," honra não só a sua morte, mas também a de todos os "antigos combatentes," que "participaram na luta armada de libertação".

Fontes:

https://www.rfi.fr/pt/%C3%A1frica/20230120-a-noite-em-que-aconteceu-o-assass%C3%ADnio-de-am%C3%ADlcar-cabral

https://www.dn.pt/internacional/em-conacri-a-pide-ainda-matou-amilcar-cabral-15688173.html/

 

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publicado às 18:46

Os meninos-soldado da guerra de Angola

por Elsa Filipe, em 13.02.19

Hoje trago um tema, bastante polémico, mas do qual não nos podemos esquecer: os meninos-soldado. São crianças, raptadas, vendidas ou até recrutadas, que se juntam a grupos armados e combatem nas guerras de todo o mundo. Sobrevivem em condições desumanas, na maioria das vezes sem abrigo, alimentação adequada ou cuidados de saúde. Muitas morrem devido a ferimentos por armas de fogo, explosões ou de doenças contraídas e das quais não chegama  ser tratadas. Outras tantas são violadas, mutiladas...

Durante toda a História mundial, há inúmeros exemplos do uso de crianças em conflitos armados, seja propositadamente ou pela força das circunstâncias. É muito recente a condenação explícita e global da participação ativa de crianças em conflitos e guerras, uma vez que só em 1989 foi assinada a Convenção sobre os Direitos da Criança, onde se pode ler que: “os Estados Partes devem tomar todas as medidas possíveis na prática para garantir que nenhuma criança com menos de 15 anos participe directamente nas hostilidades”.

Uma notícia na RTP em 1990, já alertava para esta problemática, dizendo que "MPLA e UNITA incorporam crianças nas suas forças de combate devido ao desgaste humano provocado pela guerra civil no país". Tanto Angola como Moçambique ratificaram a Convenção sobre os Direitos da Criança em 1990, mas sabemos que as suas diretrizes não foram cumpridas.

Nesta pequena notícia, é mesmo mostrado um documento onde se intima jovens a partir dos 16 anos a se recensearem, mas em imagens da mesma época vemos que existem crianças bem mais novas de arma na mão.

Um relatório da Human-Rights, viria a dizer que estas crianças-soldado, que lutaram na guerra civil de Angola tinham sido excluídas dos programas de desmobilização, aquando do acordo que estabeleceu a paz na extensão continental de Angola em 2002.

"O contigente esquecido" foi um relatório criado na época e que dá a conhecer essa problemática. Em dados apresentados nesse ano, estimam que cerca de 11.000 crianças estiveram envolvidas nos últimos anos dos combates. Algumas crianças receberam treinamento no uso de armas e participaram diretamente dos combates, enquanto que outras atuaram como carregadores, cozinheiros, espiões e trabalhadores. A estas crianças eram dadas também drogas, como por exemplo, a Canábis. Fugir não era opção, porque quem tentava fugir era morto e, muitas vezes era pedido a uma das crianças que matasse outra que tinha tentado fugir da base. Se não o fizesse, ela mesma era morta. O medo era constante. 

O uso de crianças em conflitos armados viola a legislação de inúmeros países, entre os quais, Angola, bem como viola de forma bastante clara as leis internacionais. Sobre Angola recai a obrigação de providenciar a recuperação e reintegração de todas as crianças afetadas pelo conflito.

Além das agruras da guerra, as crianças-soldado foram privadas de oportunidades educacionais, vocacionais e de desenvolvimento, o que faz com que estas crianças necessitem particularmente de programas de reabilitação adequados com as suas experiências específicas. Sem nenhuma assistência, elas correm o risco de serem manipuladas no futuro, tornando-se mais vulneráveis a serem atraídas ao serviço militar ou ao exercício de atividades ilegais.

Ainda segundo "O contingente esquecido", os soldados da UNITA espancavam frequentemente as crianças que cometiam qualquer infração e forçavam-nas a realizar trabalhos perigosos, além de abusarem sexualmente das adolescentes ou de as ofereceram como "esposas" aos soldados.

As forças armadas do Governo também usaram rapazes na guerra, se bem que em número mais reduzido do que a UNITA. 

As crianças que atuaram na guerra devem primeiro ser identificadas e reconhecidas para garantir que as ofertas tangíveis de assistência realmente as beneficiem.

Em abril de 2002, a guerra terminou na parte continental do país, depois de décadas de combates. A infra-estrutura do próprio país estava em ruínas: escolas e clínicas de saúde tinham sido completamente destruídas e restavam poucos profissionais qualificados para prestar os serviços.

O sucesso dos projetos de reintegração das crianças-soldado dependerá de uma maior dedicação de recursos por parte do governo para prestar os serviços básicos a todos os angolanos. Quem passou por isto, tem traumas muito profundos.

Fontes:

https://arquivos.rtp.pt/conteudos/mpla-e-unita-incorporam-criancas-nas-suas-forcas-de-combate/

https://www.hrw.org/pt/news/2003/04/28/226507

https://www.dw.com/pt-002/a-inf%C3%A2ncia-passada-na-guerra-crian%C3%A7as-soldado-em-mo%C3%A7ambique-e-angola/a-17799763

 

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publicado às 12:48

Há reportagens que são marcantes pela forma como conseguem fazer transparecer o que se passa lá fora e ainda hoje, volvidos 25 anos da primeira edição da Revista Visão, "A agonia de Angola", nos dá um murro no estômago. A reportagem é da responsabilidade de dois grandes jornalistas: J. Plácido Júnior e Inácio Ludgero, que foram os enviados especiais ao Huambo e que testemunharam na primeira pessoa o drama dos milhares de pessoas que fugiam da guerra civil. 

Nessa imensa coluna de gente, seguem os refugiados que fogem do Huambo, depois da "vitória do movimento de Jonas Savimbi, em 6 de Março" desse ano e que "totalizava sete a oito mil pessoas, um terço das quais eram militares governamentais." Cerca de trinta portugueses deviam estar nesta marcha, mas os jornalistas não os encontram. A coluna encontra-se fragmentada pelas constantes perseguições e "ataques movidos pela UNITA". 

Na reportagem, que vale a pena ler na íntegra, contam a história de uma mulher que, sozinha conseguiu trazer com ela sete crianças que foi "apanhando" pelo caminho, entre o Huambo e Caimbambo, Benguela. A fome e a morte ensombram aquele local, enquanto ali perto se ergueu um mercado onde estão a vender produtos roubados dos camiões de ajuda humanitária a preços excessivamente altos. É a miséria humana no meio da guerra. Crianças que se foram perdendo ou que foram ficando abandonadas à sua sorte. Depois acabam por explicar como Bernardete, uma portuguesa, se reencontra com um dos filhos depois de se terem perdido uns dos outros durante a caminhada. O menino tinha fugido ao ver um amontoado de corpos. Bernardete perdeu um bebé de 8 meses, morto pela fome, e ainda não sabia do paradeiro do seu marido e de outro filho aquando da reportagem. A dúvida sobre o paradeiro dos restantes portugueses mantém-se, embora muitos possam ter sido assassinados.

A Guerra Civil Angolana foi um conflito armado interno, que começou em 1975 e continuou, com interlúdios, até 2002. A guerra começou imediatamente depois de Angola se ter tornado independente de Portugal em novembro de 1975. O conflito foi uma luta de poder entre dois ex-movimentos de guerrilha anticolonial, o comunista Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA) que era principalmente um movimento urbano em Luanda e arredores e a anticomunista União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA) que era uma ramificação do FNLA, era um grupo de base rural.

A UNITA foi fundada em 1966 por Jonas Savimbi, que até então era um líder proeminente da FNLA. Durante a guerra anticolonial, a UNITA recebeu algum apoio da República Popular da China. Com o início da guerra civil, os Estados Unidos decidiram apoiar a UNITA e aumentaram consideravelmente sua ajuda à UNITA nas décadas que se seguiram. No entanto, no último período, o principal aliado da UNITA foi o regime de apartheid da África do Sul.

O MPLA também teve apoio externo. Durante a luta anticolonial entre 1962 e 1974, o MPLA foi apoiado por vários países africanos, bem como pela União Soviética. Posteriormente, Cuba tornou-se o seu aliado mais forte, "enviando significativos contingentes de combate e pessoal de apoio a Angola." Esse apoio, junto com o apoio da Alemanha Oriental, foi mantido durante a Guerra Civil. A extinta Jugoslávia comunista também forneceu apoio militar e financeiro ao MPLA.

Fontes:

https://visao.pt/iniciativas/2018-03-21-reportagens-com-historia-1993-a-coluna-do-terror/#&gid=0&pid=1

https://arquivos.rtp.pt/conteudos/guerra-civil-no-huambo/

https://pt.wikipedia.org/wiki/Guerra_Civil_Angolana

 

 

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publicado às 20:30


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